Eleições, um passo

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As Eleições marcam o início de um novo ciclo, resultado da vontade dos cidadãos. É, nesse sentido, um passo novo, mas não um “passe de mágica”. A sociedade é desafiada a compreender: há um longo caminho a ser construído, exigindo o empenho e a contribuição de cada cidadão. Por isso, não se pode acreditar na solução imediata dos problemas, simplesmente porque determinado candidato venceu o pleito. O dia seguinte às Eleições não é um “conto de fadas”. Para vencer seus muitos desafios, o povo brasileiro necessita buscar respostas alicerçadas em um profundo humanismo, em princípios e valores fundamentais conforme exige o sistema democrático.  

É ilusória a possibilidade de se conquistar o bem comum fora dos trilhos da democracia, por meio de escolhas unilaterais ou imposições. A participação cidadã, além de possibilitar a escolha dos representantes do povo nas eleições, assegura aos governados a prerrogativa de acompanhar e direcionar a atuação dos próprios governantes. Assim, o sistema democrático oferece mecanismos para que o poder do Estado não seja apropriado por interesses particulares ou objetivos ideológicos.

A partir das eleições é necessário renovar a compreensão de que uma autêntica democracia requer um Estado regido pelo Direito, sobre a base de uma rica concepção do ser humano, conforme ensina a Doutrina Social da Igreja Católica. Os eleitos, acima de tudo, têm o compromisso de defender a democracia. Essa defesa vai além do mero respeito formal a determinadas regras. É preciso aceitar, com convicção, os valores que inspiram os procedimentos democráticos: o zelo pelos direitos e pela dignidade humana, a busca do bem comum.

Sem o consenso sobre a importância desses valores, a democracia perde a sua estabilidade. Por isso, é perigoso quando os representantes do povo, nos três poderes, navegam no leito do relativismo ético. Esse relativismo leva à manipulação de valores, que passam a ser negociados, em vez de serem compreendidos como critérios objetivos a serem respeitados. Consequentemente, o exercício da representatividade deixa de ser eficaz, pois os poderes tornam-se caminho para alcançar objetivos pouco nobres. Uma democracia sem princípios converte-se, facilmente, em totalitarismo, aberto ou dissimulado.

Para se preservar o regime democrático é preciso agir em conformidade com a lei moral, que é soberana e sustenta o indispensável equilíbrio entre os poderes. Nesse horizonte, espera-se competência humanística daqueles que exercem o poder. Assim se legitima a autoridade perante o povo e se conquista credibilidade. Deve ser compromisso primordial dos eleitos promover a boa convivência civil, sendo sempre sensíveis às dores do povo. Para exercer essa tarefa, não podem subestimar a dimensão moral no exercício do mandato político.

Lamentavelmente, são muitas as deformações do sistema democrático – a corrupção política, a traição de princípios morais e a inaceitável negociação da justiça social. Para corrigir esses descompassos, os partidos políticos devem ser capazes de favorecer a participação cidadã, consolidando o entendimento da responsabilidade de todos pelos rumos da sociedade em um sistema democrático. É exigido qualificado desempenho dos que ocupam cargos nos três poderes, mas também é indispensável a colaboração cidadã de cada pessoa na definição dos rumos do país.  A cidadania brasileira está desafiada a conquistar novos modos de agir. A primeira etapa desse desafio é o voto consciente, com lucidez. Esse voto qualificado contempla também o entendimento de que as eleições não têm força mágica, com o poder imediato de tudo mudar, mas constituem um importante passo, na tarefa de se percorrer um longo caminho. 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo

Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte (MG)

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