A sabedoria dos ciclos ensina, com simplicidade, que a vida se configura a partir de elos que se abrem e se fecham. Importante saber a hora certa para iniciar um ciclo ou fechá-lo. Administrar de forma equivocada os ciclos da vida resulta em perdas. Paga-se caro pela falta de sabedoria na gestão de diferentes fases. Trata-se, obviamente, de um desafiador processo existencial. Por falta dessa sabedoria, tropeça-se nas escolhas. E a vida é feita de escolhas.
Perde-se muito com a incompetência para conduzir processos. Os resultados são atropelos e descompassos, gerando prejuízos. Desperdiça-se a oportunidade para ganhos que poderiam levar indivíduos e a sociedade a alcançarem metas importantes. Essa incompetência em reger processos deriva, em parte, da síndrome da desconexão: a pessoa desconhece qual é o seu lugar e a relevância da sua participação em ambientes institucionais, segmentos diversos ou mesmo no contexto mais amplo da sociedade.
As opiniões são desconexas, indivíduos se acham os “donos” da verdade – pura ilusão. Essa síndrome leva à perda da capacidade para discernir e interpretar a realidade. Consequentemente, mistura-se tudo, sem adequada leitura dos cenários sociopolíticos, culturais, religiosos, entre tantos outros. Perde-se a noção dos ciclos da vida. Saber reconhecê-los é fundamental para identificar e gerir bem as muitas etapas, desde seu início, o desenrolar dos processos, até o momento de sua conclusão.
Somente assim pode-se alcançar conquistas, pois a vida, em sua complexidade, é muito mais que um conjunto de dados matemáticos. Exige sabedoria na articulação das muitas variáveis que definem cada ciclo, produzindo avanços e encontrando respostas, recuperando sentidos e reabilitando valores. A sabedoria dos ciclos na composição da vida pessoal, familiar, religiosa e política é uma referência civilizatória no tecido de uma sociedade, nas suas práticas sociais e políticas.
A inevitável experiência da morte revela uma verdade: os diferentes ciclos da vida, invariavelmente, chegam a um fim. Por isso, é preciso urgência em gerenciá-los bem, pois a morte – fim de um ciclo – não pode significar fracasso. Ao invés disso, deve representar a passagem para uma nova etapa. O Mestre ensina: a morte é caminho para uma vida que não passa, cuja garantia vem d’Aquele que morreu e ressuscitou, Jesus Cristo, o único Senhor e Salvador. Na morte de Jesus, a morte humana, experiência sob o signo do pecado, torna-se acesso à vida. Deus permanece fiel ao ressuscitar Jesus para uma vida nova.
Identificada com a morte de Cristo, a morte humana torna-se sacramento pascal da passagem deste mundo para o Pai. A morte, assim, fecha um ciclo, o tempo que é dado a cada pessoa, como dom de Deus. Compreende-se, no horizonte desse desfecho decisivo, a importância de se gerenciar, com qualidade, os diversos ciclos da existência. É imprescindível qualificar-se, humana e espiritualmente, para reger os diferentes processos da vida, de modo adequado.
A sabedoria para se viver ciclos conta muito também na configuração ou recomposição do tecido social e político de uma sociedade. As eleições de 2018, com suas peculiaridades e muitos desafios, significaram o fechamento de um momento político. Agora, nos primeiros passos de uma nova etapa, é ainda mais fundamental a participação dos cidadãos, das instituições e diferentes segmentos da sociedade. Configura-se no horizonte a exigência de reformulações profundas, a substituição de dinâmicas, a adoção de técnicas modernas para respostas eficazes. Um tempo para repensar e redefinir a sociedade brasileira.
Não falte lucidez para o mea culpa que se fizer necessário, nem a abertura para o diálogo, de modo a superar intolerâncias. Assim não se perderá o valor da democracia. Cada pessoa e diferentes instituições estarão unidas para superar destrutivas polarizações e acusações. As muitas diferenças não serão obstáculos para os avanços, pois prevalecerá a força da unidade e da comunhão que permitem ao povo se reconhecer como pertencente a uma mesma pátria. Avanços e correções, conquistas e novas respostas serão possíveis se todos forem aprendizes da sabedoria dos ciclos.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte (MG)
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