A sociedade contemporânea, brindada por tantos especializados saberes, padece pela carência de uma sabedoria fundamental: o pilar do relacionamento humano. Sabe-se da importância de diferentes estratégias, mas, para se alcançar êxito, não se pode descurar da qualidade do relacionamento humano. Propósitos são alcançados graças à eficiência técnica, logística, ao monitoramento de resultados. Ainda mais determinante no cumprimento de objetivos é o campo relacional, inerente a todas as atividades humanas. Muitas iniciativas naufragam por causa de inabilidades relacionais. Até mesmo ações que apontam para um horizonte inovador podem nem “sair do papel”, pela falta de competência relacional, especialmente na condução de equipes, no cumprimento da tarefa de estimular o envolvimento de seus integrantes.
Aos doutos, em qualquer área, não é difícil conceber projetos com engenharias inteligentes e contemporâneas. O desafio maior é impulsionar a realização desses projetos com o vetor do relacionamento qualificado, o que exige habilidade para lidar com dilemas existenciais e humanos. A falta de qualificação de líderes na administração do relacionamento interpessoal gera acentuadas perdas nos mais diversos campos – da política à religião, da economia à cultura, da educação às artes. Exercer a liderança significa também tornar-se ponto de apoio para liderados e parceiros na realização compartilhada de projetos. Para isso, é preciso superar circunstâncias que enjaulam o ser humano, a exemplo da mesquinhez e a tendência muito comum de se buscar aproximar apenas daqueles com quem se partilha das mesmas opiniões e convicções. Deve-se alargar a própria interioridade, capacitando-a para gerar agregação entre pessoas com diferentes modos de pensar, mas que estão envolvidas na busca de uma mesma meta.
A habilidade para se constituir uma referência que alimenta agregação entre as pessoas não pode ser confundida com a capacidade para dar ordens. As equipes demandam de seus líderes uma desenvoltura relacional capaz de torná-los presença cativante, com palavras que iluminam, inflamam e impulsionam. Não basta, pois, “ocupar uma cadeira” no exercício do poder, da autoridade ou das mais diferentes responsabilidades. Sem competência relacional, prevalece a mediocridade. As instituições padecem com a falta de clareza e de investimentos na competência relacional. Não conseguem transformar seu potencial em realizações, desperdiçando-o. “Times” que confiam no seu líder, reconhecendo-o com importante retaguarda, “jogam” melhor, com mais chance de alcançar seus propósitos. Por isso mesmo, em sintonia com as demais aptidões que são vetores de conquistas, deve-se investir na essencial competência relacional.
O cultivo da competência relacional, desenvolvendo habilidades essenciais ao exercício da liderança, contempla reconhecer o valor da reciprocidade, estimular diálogos, motivações e mobilizações que levem às metas almejadas. Trata-se de caminho eficaz para governanças corporativas e para a vivência da dimensão missionária, constituindo uma força para tecer vínculos de pertencimento essenciais ao viver com alegria, com disponibilidade para se dedicar ao semelhante, promovendo o bem. Especializar-se na habilidade para bem gerir relacionamentos é, pois, primordial. Uma habilidade que se conquista a partir de um itinerário bem diferente de outras especializações que, não raramente, fazem perder a “visão de conjunto”, do todo. E sem essa compreensão mais global das situações, abandona-se o princípio de que tudo está interligado. No campo relacional, deve-se alimentar a “visão de conjunto”, sem privilegiar uma parte, dedicando atenção a diferentes temas, abordagens e modos de compreender a realidade. Seguir na direção oposta pode levar a uma parcialidade que se desdobra no empobrecimento das possibilidades.
Investir na dimensão relacional não significa buscar simplesmente a execução de técnicas. Contempla abraçar uma dimensão espiritual determinante e insubstituível, com propriedades para reconhecer que a vida é dom e um instrumento de transformação do mundo. Qualificar-se na competência para bem se relacionar – e tecer bons relacionamentos – pede, especialmente, profundo cultivo da espiritualidade, revestindo-se da capacidade para viver a reciprocidade, que é uma alavanca de inclusão relacional. A reciprocidade também semeia engajamento essencial à realização de diferentes projetos, fecundando a fonte de convicções que refinam os discursos e garantem desempenhos relevantes. Descompassos institucionais, nas instâncias do poder e em outros segmentos da sociedade, apontam também para a falta de competência relacional. Perde-se muito tempo e energia quando há pouca efetividade em razão da falta de especialidade para tecer relacionamentos. Convive-se com superficialidades e diferentes descompassos, perpetuando exclusões e disputas. O viver preenche-se de sentido e de alegria espiritual quando se prioriza o pilar do relacionamento.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte (MG)
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