Há um desafio que precisa ser assumido, como tarefa e responsabilidade, pela humanidade: educar-se sempre. Uma urgência quando se considera a degradação da Casa Comum, com consequências que pesam sobre a vida de todos. A tarefa de educar-se sempre não pode ser confundida com a dedicação à educação formal. A propósito, é oportuno lembrar que grande parcela da sociedade ainda está excluída do direito à educação formal, com pessoas padecendo com o analfabetismo. Importante reconhecer que educar-se sempre vai além dos ciclos da educação formal. Pode-se ingressar nesses ciclos ou deixá-los, definir tempos de permanência, a partir de razões e interesses diversos. Já a responsabilidade de educar-se sempre é um horizonte para a vida toda, pois determina a qualidade da participação cidadã, da dedicação à construção de instituições e sociedades, com incidências também na realização vocacional e pessoal de cada um. Todos devem educar-se sempre – exigência para contracenar com outras pessoas na consolidação da amizade social, capaz de evitar derrocadas e desorganizações que agridem a sacralidade do dom de viver.
A preciosidade e essencialidade da educação formal, profissional ou vocacional devem ser reconhecidas, mas, sozinhas, podem não ser capazes de promover uma adequada estatura humana para bem exercer responsabilidades. Involuções provocadas pela desconsideração de referências importantes, capazes de alavancar a estatura humana, geram prejuízos institucionais e sociais. Para vencer essas involuções, é preciso educar-se sempre, um processo humano e espiritual indispensável à convivência social. Trata-se de oportunidade para reagir diante da crescente deterioração do tecido moral e sociocultural de uma sociedade. Essa deterioração leva a violências crescentes, a diferentes formas de perversidade, a desumanizações frias e mortais. Provoca também formas patológicas e calculistas de convivência, agravando cenários de exclusão e de discriminação na sociedade.
O desafio-tarefa de educar-se sempre inclui desde a competência humana e espiritual de relacionar-se qualificadamente até a capacidade para desenvolver tecnologias sem transgressões à dignidade humana. A humanidade está convocada a refletir, assim, sobre o que fazer para não se distanciar do que é humanisticamente essencial, garantindo adequado balizamento para a vida no planeta. Nessa perspectiva, deve-se considerar o campo da tecnologia que é determinante para os rumos da sociedade, inspirando forte envolvimento dos jovens. O desenvolvimento da técnica deve vir acompanhado de um pensamento crítico capaz de salvaguardar o que é singular à condição humana, sem a ingenuidade de acreditar que é possível robotizar o coração – a sensibilidade humana.
O ser humano é muito mais que uma máquina. Reúne um universo de qualidades e de experiências capazes de gerar sentido. Uma genialidade que nenhum dispositivo tecnológico pode alcançar. Valores espirituais, afetivos e morais são exclusivamente aprendidos e desenvolvidos pelo ser humano, individualmente ou no contexto social. É preciso educar-se sempre no horizonte desses valores, o que significa investir na solidariedade e engajar-se na promoção da cultura do diálogo – promover inclusões e redes de cooperação, superando situações marcadas pela indiferença. Pode parecer ingenuidade acreditar na força do diálogo, mas é preciso reconhecer: trata-se de uma arte com características terapêuticas para fecundar e promover valores humanos, especialmente para desenvolver a habilidade essencial à construção de uma convivência mais harmoniosa entre as pessoas.
As intolerâncias de todo tipo nascem e se alimentam da falta de diálogo, criando distanciamentos, sustentando mágoas e rancores, altamente prejudiciais à família humana. Por isso, a arte de dialogar é um capítulo primordial na tarefa de educar-se sempre, que contempla, ainda, o aprendizado de tudo que é belo, bom e verdadeiro. A beleza encanta o ser humano, atrai e gera envolvimento, promovendo transformações, cura para a alma, iluminações para horizontes humanitários. Assim, a beleza toca e edifica o coração humano, envolvendo-o em um brilho que faz ponte com a grandeza da dignidade de toda pessoa. É, pois, uma larga porta que permite ao mundo enxergar critérios éticos, impulsionando escolhas e atitudes capazes de promover a amizade social. O reconhecimento desses critérios leva a uma lúcida e equilibrada compreensão da justiça, do direito e da paz. Para alcançar essa lucidez, é preciso educar-se sempre, trilhando um caminho indispensável e qualificado, no horizonte de Deus, por uma espiritualidade fecunda, para que seja possível edificar uma nova humanidade.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte (MG)
Comments
No comment